quinta-feira, 3 de março de 2011

PARTE I - PROLEGÔMENOS

Às vezes chego a achar cômica a minha situação de assumidamente ter problemas com a ansiedade e o pânico e ao mesmo tempo ser motociclista. Mas às vezes acho que isso se chama disciplina e superação.
Para se ter idéia de como funciona nossa cabeça maluca, quando resolvi tirar habilitação para carro e moto estava numa fase maravilhosa, só que como todo bom ansioso, primeiro comprei a moto para depois me inscrever para tirar a carteira, tudo bem que também estava aproveitando as facilidades do mercado para financiamentos, mas mesmo assim o carro como sempre, veio antes dos bois.

No desenrolar dos fatos, como andei um pouquinho em lugares ermos com a moto, mesmo sem carteira, adquiri um tanto mais de confiança para a prova, ao passo que carro, só o da auto escola mesmo, e para ajudar na hora da prova de direção, a simpatia em pessoa senta do seu lado e fica mandando fazer isso ou aquilo da forma mais grosseira que ela consegue mandar e lá se foi seu sistema nervoso pelo cabo da embreagem. Faça uma prova nessa situação. Já na prova de pilotagem, graças ao bom Deus, a simpatia tem medo de ir na garupa de estreantes, então você faz tudo sozinho, bem mais tranquilo.
Reprovei, óbvio na primeira prova de direção e o instrutor não deixou fazer a prova de moto. Aguardei um mês para reprovar novamente na prova de direção mas por incrível que pareça o instrutor foi muito gente boa e me deixou fazer a prova de pilotagem. Passei.
Fui à auto escola, cancelei a habilitação B e fiquei só com a A mesmo. Não ia deixar uma moto zero estragando na garagem por conta de uma habilitação para carro que nunca saía sendo que eu nem tenho carro e nem sei quando vou ter.
O fato é que nesse período das duas provas a ansiedade foi a mil. Fora as cobranças: mas logo você? Como que você vai ficar nervosa com uma coisa tão simples? O instrutor da auto escola cobrando: como que você dirige bem na aula e não passa na prova? E a auto estima lá em baixo da barriga da cobra a essa altura do campeonato. Aliás dói mais ainda quando saio na rua e vejo cada barbaridade cometida por pessoas habilitadas que realmente não entendo como que eu não tenho carteira e essas pessoas tem...ou seja não precisa ser bom motorista, basta ter sangue de barata.
Toda essa ansiedade, cobranças externas e as piores – as internas – acabaram com meu sistema nervoso e ainda fizeram com que na hora em que eu já estava com minha habilitação na mão, olhar para a moto e não conseguir subir nela, quem dirá dar a partida e andar.
Nessa hora entrou a ajuda mais valiosa que tive, que foi a do meu marido. Ao invés de fazer o papel de marido convencional e dizer: Como que você vai andar de moto nesse estado, quer se matar??? – ele fez o papel contrário. Me convenceu que eu sabia andar muito bem e que eu deveria começar aos poucos. Uma manobra na garagem, uma volta na quadra, uma ida na casa do meu pai... e assim fui ganhando território. Não bastasse isso, a carteira dele saiu depois da minha, então ele ainda andava na minha garupa sem criticar nem demonstrar medo, mesmo quando eu deixava a moto morrer em alguma subida, com algum carro vindo atrás. Falem a verdade, isso não é um anjo?
O medo de morrer, claro, sempre me perseguia, mas quem sofre desse mal sabe do que estou falando: me dei conta que me trancar em casa com medo de cair de moto, com medo de passar mal enquanto piloto, com medo de desmaiar e ninguém socorrer é a pior forma de morrer em segurança, no conforto do lar.
Aí comecei a enfrentar pequenos medos: sempre dizia que queria uma moto só para ir à casa do meu pai sem depender de ônibus, pois passar a ponte de jeito nenhum. Mas ir até a casa dele era tão divertido, então por que não tentar passar a ponte?
Escolhi um dia frio e sem muito movimento e falei para o meu marido: eu vou ali passar a ponte e já volto. Depois da travessia a sensação foi tão boa que resolvi deixar a moto me levar, depois de um tempo liguei para casa avisando que estava lá no sul da ilha, na Armação do Pântano do Sul.
Adorei o passeio, então cada vez que sentia vontade de dar uma volta, ia para lá, não me arriscava para outros lados pois tinha medo de andar na beira mar norte de moto, porque lá tem “muito movimento”.
No outro ano, nas férias resolvi encarar as praias do norte e para isso precisava passar pela beira mar.
Saí de casa e poucos quilômetros adiante comecei a sentir uma tremenda falta de ar, palpitação, suador, medo, aí já veio aquela sensação de “o que eu estou fazendo aqui em cima desta moto?” e pensei em voltar. Fiz um retorno e parei num posto de gasolina. Adotei uma prática de me dar broncas do tipo: Aí, você é uma mulher ou um rato? Vai passar a beira mar, sim, ou quer morrer dentro de casa?
Entrei na loja de conveniência, peguei uma água, fiz exercícios de respiração, subi na moto e fui. Cheguei sem problemas à Cachoeira do Bom Jesus, para isso passando pela beira mar e pela SC 401, rodovia bastante movimentada.
Ano passado fiz minha primeira “viagem” como garupa, subindo a BR 282 com meu marido pilotando até Bom Retiro.

Tinha um trauma enorme da BR 101, então no ano passado fui pilotando à Itapema (60 km de Florianópolis) com um grupo de amigos motociclistas, pelo trecho norte totalmente duplicado.

E este ano quebrei o tabu que era vencer a BR 101 para o sul, aventura que será contada na parte III deste texto.

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